15º Dia - Roubam os bastões e compra-se o Cajado!

Boa noite seguidores!


Sim, são 21 horas e encontro-me no Albergue de Peregrinos de Burgos.


Antes de falar do meu dia gostaria de registrar uma noticia que tive antes de ontem, no albergue de Belorado. Nossa amiga do Caminho (Albergue Orisson) Sheila, teria chegado no albergue chorando muito e sem conseguir mais andar. Ela já havia me dito que tinha sido operada no joelho e que havia trazido injeções para dores. "Pega mais leve, anda menos horas por dia", aconselhei. Depois ela havia desaparecido.
Foi levada ao Hospital de Burgos e possivelmente deverá adiar sua chegada a Compostela. Desejo muita saúde à amiga do Caminho Sheila.


Meu dia de hoje começou tarde. Estava hospedada em um hotel na pequena cidade de Villafranca Montes de Oca, como havia registrado ontem, para poder descansar pois a subida seria difícil. O casal de amigos brasileiros decidiu continuar. 

Igreja de Villafranca Montes de Oca

À noite como sempre, estava massageando os pés e pensando como damos pouca importância a esses dois membros (pernas e pés) tão importantes em nossos dias. E eles são extremamente complexos apesar de se mostrarem simples. E nesse meu encantamento com  pés e pernas, decidi homenagear quem não pode fazer uso deles, temporário ou definitivamente, dedicando o dia de hoje - a caminhada do dia 15 de abril!


O meu café da manhã somente foi servido às 7:30 o que retardou meu início da caminhada. 
Comecei a subir por volta das 8 horas, já sabendo que a caminhada seria dura e difícil. Mas a paisagem era belíssima, e o tempo estava ótimo. Ainda muitas nuvens no céu. 

Villafranca amanhecendo e se distanciando

No alto, um cartaz anunciava os animais existentes na região: lobos, javalis, etc. Por precaução, resolvi não ligar minha musica Era. Qualquer barulho estranho estaria pronta com meus bastões... (até parece!).

Aviso no Alto do Montes de Oca

Entrava no bosque e continuava a subida até em cima quando avistei um monumento a 300 pessoas fuziladas durante o regime de Francisco Franco.

O Caminho hoje - bosque tranquilo...

Monumento aos fuzilados (Placa)

Monumento aos fuzilados

O Caminho hoje estava estranhamente vazio. Poucas pessoas me passavam..
Cheguei finalmente em San Juan de Ortega, cidade charmosíssima e que me deixou com passagem feliz pois neste momento Joaquim me ligou o que me deu novo pique.

Chegada a San Juan de Ortega

Cidade San Juan de Ortega

Tomei um café com leite no único bar aberto e continuei o Caminho, pelos bosques, subidas e descidas. 

Subidas e descidas no Caminho hoje

Bosque após San Juan de Ortega

Estava decidida em pegar um ônibus em Agés, conforme tinha me orientado a Associação dos Peregrinos de Saint Jean, evitando-se assim a entrada confusa e complicada da cidade de Burgos. Como eram ainda 11:30 hs, pensei também em almoçar por lá. Lembrava sempre que estava homenageando os que não podem utilizar pés e pernas. 
Todas as fotos foi pensando neles com muita luz. E "empurrava" pra trás o Caminho com meus bastões.


Cheguei em Agés.

Chegando Agés

Chegada em Agés

Em Agés bati de frente com um Restaurante simples e convidativo. Resolvi ficar por ali mesmo, fui recebida por um homem cheio de massa e sua mãe (parecia). Ele foi logo me convidando pra entrar e já me lançou o menu no que escolhi a salada mista e um prato à base de abobrinha e molho de tomate. Estava tudo muito bom e o casal super simpático. Fiz perguntas sobre o ônibus mas ele foi logo me dizendo que não passava ônibus ali. Teria que ir até Villafria se quisesse um. Peguei outras informações do trajeto e sai, sem antes procurar outro comercio da cidade para checar se o simpático senhor não queria que eu ficasse em sua pousada. Mas a informação foi confirmada. Não contava com isso, teria que andar ainda 12 km.
Bom, o dia estava lindo, tinha um sol forte mas amaciado pela brisa fria que soprava. E continuei o Caminho, no asfalto...

Saida de Agés

Cheguei a Atapuerca, patrimonio da Humanidade, cidade arqueológica. 

Chegada a Atapuerca

Lá encontrei com vários jovens em um ônibus escolar. Provavelmente faziam uma visita ao centro de arqueologia da cidade. Estavam todos espalhados pela cidade. Resolvi parar para descansar em um bar e óbvio, tomar um café e utilizar os "servicios" (banheiro).


Quando resolvi pegar minha mochila e bastões, constatei apavorada que tinham furtado meus bastões!! 


E agora, como vou caminhar sem os bastoes? 


Procurei o dono do bar mas ele também não havia visto nada! 


Andei pela cidade meio que cambaleando, olhando os jovens e pessoas (inclusive peregrinos), na esperança de poder rever meus bastões azuis, pensando que talvez fosse uma "pegadinha", quem sabe... 


Nada! o tempo passava... e conclui que nao havia mais nada a ser feito. Estava sem os bastões. 


E me veio a lembrança que havia dedicado o dia aos que não tem oportunidade de utilizar pernas e pés, temporário ou definitivo. E estava eu utilizando dois apoios a mais além das pernas... E agora haviam sido furtados! Teria que continuar somente com minhas pernas e pés.


Comecei a subir o monte que se prometia difícil, com muitas, muitas pedras. Minhas  pernas doiam, principalmente os joelhos. A subida era extremamente sofrida, senti as lágrimas se misturarem ao suor e tudo escorria. Alguma coisa tudo isso parecia querer me dizer. 

Há de utilizar apenas as pernas e pés...

Muitas pedras e uma subida sem bastões

Chegando lá no alto, um cartaz pedia para apreciar a paisagem. E foi o que eu fiz. E estava só, totalmente só. Ninguém na frente ou atrás. E portanto estava no Caminho!

Apreciem a paisagem!

Passei por várias cidadelas (vazias) e constatei que já dava 18 horas. Estava longe, muito longe da cidade Villafria, e nenhum local para se passar a noite! 


Ao longe vi uma torre de Igreja. Apertei o passo para chegar à cidade. Que benção, um bar aberto me sorria. 
Entrei e perguntei se tinha algum local para pousar na cidade. Não havia. Veio então a solução. Pode ligar para um taxi me levar a Burgos por favor? E assim foi feito.


Cheguei em Burgos perto de 19 horas. Já no final das vagas no albergue. Estou confortavelmente instalada. O Albergue é limpo, organizado, com uma infraestrutura ímpar. 
A cidade é linda, viva e agitada! Tomei banho e me curei para vivenciar toda aquela energia. 

Chegada em Burgos

E vão algumas fotos pra vocês desse dia impar que passei hoje.


São coisas do Caminho. A cada um interpretar!


Ah! comprei um cajado em Burgos, para amanhã..


Boa noite a todos!
Ultreya!
Isabelle

Compostela 525,5 km

Flores do Caminho

Meu Albergue em Burgos

Catedral de Burgos

Praça em Burgos

Caipirinha em Burgos - Brasil presente!